Módulo 4

 


SÓCRATES: MODELO DE FILÓSOFO


1- SÓCRATES E A FILOSOFIA COMO ATITUDE CRÍTICA

 




  A filosofia como atitude crítica e questionadora: essa concepção atribui à filosofia o papel de colocar em xeque nossas opiniões e crenças habituais, perguntar sobre seu sentido e fundamento, problematizar o senso comum, buscar alternativas, não aceitar a primeira resposta dada, a solução aparentemente mais fácil e mais óbvia.

A atitude crítica já era um aspecto presente no pensamento dos primeiros filósofos, e não apenas em relação ao que era externo ao seu pensamento (por exemplo, o mito), pois os membros das primeiras escolas filosóficas tinham opiniões discordantes acerca das mesmas questões. É parte da atividade da filosofia, desde a sua origem, o debate.

O maior debatedor de toda a história da filosofia foi certamente Sócrates. Seu próprio método * foi chamado de “refutação”, pois seu objetivo central era justamente contestar * as opiniões infundadas do senso comum. *

Embora remonte a Platão a necessidade de definição do termo “filósofo” e de seus cognatos “filosofia” e “filosofar”, foi Sócrates que, pela primeira vez na história, fez da filosofia uma atividade com objetivos específicos e criou, além disso, um método para realizá-los. Foi ainda Sócrates que fez dessa atividade uma vocação, centrando toda a sua vida em torno dela, dedicando-se diariamente a ela e tendo sido, por ela e em razão dela, condenado à morte. No que consistiu essa atividade é o que veremos com base na obra de Platão, já que Sócrates nunca escreveu nada. * É nos primeiros diálogos de Platão * que encontramos o retrato mais detalhado de Sócrates como filósofo. Outros autores antigos o descrevem *, mas nenhum deles parece ter compreendido como Platão o exercício dessa atividade. *

Foi o modo socrático de filosofar que inspirou Platão a escrever sob a forma de diálogo, de onde ele derivou o nome do seu método, a dialética, que em grego quer dizer justamente “conversação”. A maioria dos diálogos platônicos tem Sócrates como personagem central. * Nos diálogos platônicos, a filosofia socrática traduz-se em termos gramaticais pela pergunta * “o que é X?”, que Sócrates dirige não a qualquer X, mas a valores especificamente humanos, tais como a justiça, o amor, a beleza etc. A pergunta, além de inédita no âmbito da moral, traz em si uma radicalidade embaraçosa: ela quer saber o que é essencialmente cada um desses valores, e não o modo como se manifestam. *

Sócrates percorre diariamente as ruas da Atenas do século V a.C., interrogando insistentemente os cidadãos, chamando sua atenção para a necessidade dessa interrogação. * Sócrates * acaba sempre por abalar as opiniões do senso comum, o que, obviamente, provoca profundo incômodo naqueles que são interrogados. * 

Diante do povo ateniense e de um tribunal que o acusa, dentre outras coisas, de corromper a juventude, * Sócrates se defende, dizendo que todas essas coisas são calúnias e que ele se pôs a examinar as pessoas porque decidiu investigar as palavras que a pitonisa do oráculo de Delfos proferiu a seu respeito, quando afirmou que ele era o homem mais sábio do mundo, por ser o único a reconhecer que nada sabe.

Examinando todos os que considerava ‘sábios’ – políticos, oradores, poetas, artífices etc. – Sócrates por fim descobriu que estava enganado, pois aqueles que sabem alguma coisa específica (por exemplo, o poeta sobre poesia) tornam-se presunçosos e acreditam saber todas as coisas, quando na verdade pouco ou nada sabem. E foi o fato de revelar a esses homens sua ignorância que provocou contra ele seu ódio e as calúnias que deram origem às acusações.* O objetivo de Sócrates não é enganar e derrubar o outro, destruindo seus argumentos. Esse é apenas um passo que poderá levar o interrogado a se dar conta da inconsistência dos argumentos que sustentam suas opiniões e crenças, estimulando-o a se envolver também na investigação. * O “sábio”, aquele que não ignora a própria ignorância, não se limita a examinar a si mesmo, mas necessita envolver o não sábio no seu exame. * O que Sócrates quer, portanto, não é simplesmente embaraçar o outro, mas é tornar o embaraço comum.

O reconhecimento da ignorância e o consequente estado * que ele provoca são passos fundamentais do método socrático. Mas devemos ainda nos perguntar: o que ganha aquele que se vê nesta situação? Certamente não se trata de substituir as opiniões dos não sábios pelas opiniões corretas do sábio Sócrates, mesmo porque Sócrates não tem posições definitivas acerca de nenhum assunto; ao contrário, parece estar sempre pronto a refazer suas opiniões.

Sócrates refuta as opiniões porque a refutação, como Platão irá escrever bem mais tarde, é uma forma de purificação das opiniões: “Quando o homem percebe isso (que suas opiniões são contraditórias entre si) fica irritado consigo mesmo e gentil com os outros. Desse modo ele se libera das opiniões autoritárias e inflexíveis *

É muito comum ver nos diálogos platônicos o dogmatismo em que estão mergulhadas as opiniões dos que pensam saber quando na verdade nada sabem. De fato, a irritação e a perplexidade causadas pelo método socrático, e mesmo a indisposição de se submeter a ele, * são apenas demonstrações do desprezo habitual que os homens comuns têm pelo exame de suas opiniões *. Pois que outra razão os faria sentir-se mal ou recusar-se a entrar no drama socrático senão a de que nunca se importaram em examinar se as suas opiniões são ou não são as mais felizes (verdadeiras) com relação a este ou àquele assunto? *

Purificar, liberar as opiniões, desfazer os preconceitos, através do exame e do confronto de discursos, é, portanto, o objetivo final da filosofia socrática. * Ela promove um exercício de lucidez, e dramaticamente revela, aos que finalmente reconhecem a própria ignorância, os limites do conhecimento humano. É a consciência do não saber que caracteriza o filósofo socrático, figura inaugural do filósofo, que influenciou muitas e muitas gerações. Sócrates fornece assim um modelo de filósofo como pensador crítico que interroga e problematiza seus interlocutores, mas que igualmente interroga e questiona a si mesmo, num exercício permanente de reflexão. Segundo sua célebre afirmação *, “a vida não examinada não vale a pena ser vivida” (PLATÃO, Apologia de Sócrates, 38a)

 MARCONDES, Danilo e FRANCO, Irley. A filosofia: O que é? Para que serve? Rio de Janeiro: Zahar, 2011. p.34, 68, 69, 46 a 51.

o uso do asterisco * no texto indica que uma parte do texto original foi retirada neste trecho com finalidade didática, para que o conteúdo apresentado ao aluno fique mais claro. 





 

       

2 - SÓCRATES E O SABER DO NÃO SABER

 

Sócrates ouve * a verdade de Apolo: "Sócrates é o homem mais sábio entre os homens". Espantado, * procura os homens que julgava sábios (políticos e poetascuja função é ensinar e guiar os outros), consulta-os para que lhe digam o que é a sabedoria. Descobre, porémque a sabedoria deles era nula. Compreende, então *: "Agora  sabes porque és o mais sábio de todos os homens". Sócrates compreende, enfimque nenhum homem sabe verdadeiramente nada, mas, o sábio é aquele que reconhece isto. O início da sabedoria é, pois, "sei que nada sei".

         Se assim é, a inscrição no pórtico do templo de Apolo - "Conhece-te a ti mesmo" - significa que o conhecimento não é um estado (o estado da sabedoria), mas um processo, uma busca, uma procura da verdadeEis o motivo que leva Sócrates a praticar a filosofia como missão: a busca incessante da sabedoria e da verdade e o reconhecimento incessante de que, a cada conhecimento obtido, uma nova ignorância se abre diante de nósIsto não significa que a verdade não exista, e sim que deve ser sempre procurada e que sempre será maior do que nós.

CHAUI, Marilena. Introdução à história da filosofia, vol. ISão Paulo: Brasiliense, 1994.  p. 142. 



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O EFEITO DUNNING-KRUGER: POR QUE AS PESSOAS FALAM SEM TER NENHUM CONHECIMENTO?

         

 

 

 

TRÊS VERSÕES DO GRÁFICO DE 

DESENVOLVIMENTO INTELECTUAL DE

 DUNNING-KRUGER

  


 


 


 


 


 



 

O ORÁCULO DE DELFOS:

 


Localização do Oráculo de Delfos na antiga Grécia: 

 


 

Falhas tectônicas que deram origem aos vapores narcóticos do Oráculo de Delfos:

 



 

Pítia ou pitonisa, sacerdotisa do Oráculo de Delfos, sentada sobre a trípode e aspirando os vapores sagrados vindos do subsolo: 

 


 

Ruínas atuais do Oráculo de Delfos:

 


 

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3 - A ORIGEM ETIMOLÓGICA DA PALAVRA FILOSOFIA: AMOR À SABEDORIA

           
 
 
        A palavra grega filósofo é formada em oposição a sophos[1], significa o que ama o saber, em contraposição ao possuidor de conhecimentos que se designava por sábio. Este sentido da palavra manteve-se até hoje: é a demanda da verdade e não a sua posse que constitui a essência da filosofia, muito embora tenha sido frequentemente traída pelo dogmatismo, isto é, por um saber expresso em dogmas definitivos, perfeitos e doutrinais. Filosofar significa “estar-a-caminho”. As interrogações são mais importantes do que as respostas e cada uma destas transforma-se em uma nova interrogação.

 JASPERS, Karl. Iniciação filosófica. Lisboa: Guimarães, 1960. p.15.

 

A palavra filosofia é grega. É composta por duas outras: philo e sophia. Philo deriva-se de philia, que significa amizade, amor fraterno, respeito entre iguais. Sophia quer dizer sabedoria e dela vem a palavra sophos, sábio.

         Filosofia significa, portanto, amizade pela sabedoria, amor e respeito pelo saber. Filósofo: o que ama a sabedoria, tem amizade pelo saber, deseja saber.

         Assim, filosofia indica um estado de espírito, o da pessoa que ama, isto é, deseja o conhecimento, o estima, o procura e o respeita.

         Atribui-se ao filósofo grego Pitágoras de Samos (que viveu no séc. V antes de Cristo) a invenção da palavra filosofia. Pitágoras teria afirmado que a sabedoria plena e completa pertence aos deuses, mas que os homens podem desejá-la ou amá-la, tornando-se filósofos.

 CHAUI, Marilena.Convite à filosofia. Ed. Ática, São Paulo, 1994. p. 19.



[1]Sophos : Transliteração da palavra “sábio”, em grego.

 


O ALVO representa a sabedoria absoluta, divina, verdade plena e completa que está além da capacidade humana de compreensão.

A FLECHA representa a filosofia, meramente humana, e portanto limitada,  que procura se aproximar o máximo que puder do alvo, embora sem nunca conseguir alcançá-lo completamente.

O ARCO representa a ignorância que, quando se dá conta de si mesma, impulsiona o filósofo à busca pela sabedoria e, quando não se dá conta de si mesma, já não é capaz de impulsioná-lo.

 



 O ELEFANTE representa a verdade absoluta, ou o divino, que, em sua plenitude, é inacessível ao conhecimento humano.

OS CEGOS representam os falsos sábios que desconhecem a sua ignorância fundamental a respeito da verdade absoluta, e por isso querem impor aos outros por meio da violência sua concepção de verdade.

O GURU representa o filósofo que, reconhecendo sua ignorância, procura se aproximar o máximo que é possível a um ser humano da verdade absoluta.

 


 

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