NIETZSCHE E O RELATIVISMO
“Relativismo” * supõe que não existe uma realidade única e acabada, mas muitas e diversas realidades. Não existe nunca um mundo em si, mas sempre variados mundos, cujos sentidos dependem da relação histórica, espacial, cultural e social, enfim, das múltiplas interpretações que o homem faz através do pensamento e da linguagem. No relativismo não existe uma medida única para avaliar a veracidade de um discurso; é preciso considerar o contexto, as diferentes perspectivas. “Não existem fatos, só interpretações”, diz Nietzsche *. A lei da gravidade não é um elemento intrínseco da natureza, mas um modelo construído para explicá-la, podendo ser corrigido ou até abandonado no futuro. Não há teoria ou interpretação que possa se justificar como absoluta. A frase “está chovendo agora” pode ser correta em um determinado contexto e errônea em outra. *
A vantagem do relativismo é a tolerância com a alteridade. Os discursos diferentes não são classificados como erro ou desvio, mas aceitos como discursos da diferença. A diversidade de perspectivas é uma característica inerente ao mundo humano. Nenhuma é mais verdadeira do que a outra, somente mais apropriada segundo o momento histórico, o contexto cultural, geográfico etc. *
Uma das desvantagens do relativismo é que não há nunca um critério último que dê garantia absoluta para as situações de impasse. Se existem várias perspectivas, todas com igual direito de ser, então é necessário fazer escolhas baseadas apenas nas condições da situação, assumindo os riscos de soluções de validade passageira. Tal atitude exige mais consciência e mais responsabilidade, enfim, é mais trabalhosa. Infelizmente o ser humano parece preferir sempre o mais leve e o mais fácil, na forma de certezas permanentes sobre o que é verdadeiro, bom e belo. Devido à falta de uma medida absoluta, reina um certo medo de que a relatividade das verdades transforme-se em uma indeterminação. Se não há fatos, nem coisas em si, então todo discurso é verdadeiro, tudo vale, ou o que dá no mesmo, nada vale, nada é verdadeiro. Qualquer afirmação, mesmo a mais disparatada ou a mais antissocial, ganha o direito de se expor. Ideologias excludentes entre si, tais como a democracia ou o fascismo, parecem ter o mesmo valor. Trata-se, entretanto, de uma visão ingênua e simplificadora do relativismo. O fato de não se aceitar uma verdade absoluta não implica * a negação radical de todas as afirmações. Há limites para o relativismo, e um deles é a completa recusa de todo discurso que arrogue para si o direito de ser o único *. Nesse sentido, o relativismo é um ato de resistência contra qualquer pensamento homogeneizante, seja na política, na ciência ou na arte.
FEITOSA, Charles. Explicando a filosofia com arte. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004. p. 46, 48, 52, 54.
É a sua concepção de
mundo que fornece a Nietzsche um critério para avaliar e hierarquizar as
interpretações *. Ao estabelecer um critério, o filósofo explicita a pretensão
de hierarquizar as interpretações e de reivindicar a superioridade da própria
interpretação. Com efeito, a afirmação de que Nietzsche estabelece um critério
e hierarquiza as interpretações exerce com frequência a função de um argumento
visando indicar que o filósofo não incorre em relativismo.
Este argumento * pressupõe * uma definição de relativismo
como equivalência de interpretações *. Ao estabelecer um critério, distinguir e
hierarquizar as interpretações, * Nietzsche * indica de fato que não
pretenderia assumir a posição de um relativismo segundo o qual todas as
interpretações se equivalem. A nosso ver * essa é uma concepção de relativismo
não só restrita em demasia, mas até mesmo equivocada: com efeito, nem toda a
concepção de relativismo exclui a possibilidade de estabelecer critério para
diferenciar e hierarquizar as interpretações. Portanto, o fato de Nietzsche
estabelecer critério para distinguir e hierarquizar as interpretações não
constitui por si só um argumento para excluir todo e qualquer relativismo de
sua filosofia.
CORBANEZI, Eder. Perspectivismo e relativismo na filosofia de Nietzsche. São Paulo: Editora Unifesf, 2021. p. 121, 122 e 123.
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Exemplos de intensos debates sobre a verdade moral no jornalismo contemporâneo, gerando para o grande público uma percepção da relatividade da verdade:
Relativismo da verdade no debate jornalístico sobre o aborto
Relativismo da verdade no debate jornalístico sobre a homossexualidade
Relativismo da verdade no debate jornalístico sobre as drogas ilícitas
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